segunda-feira, 28 de abril de 2014

Regina Casé “Esquenta” caso DG

Por Adelson Vidal Alves



Enquanto escrevo, não há provas irrefutáveis de que o tiro que matou o dançarino DG tenha partido da Polícia. Pesa contra a instituição o histórico de truculência e as notas públicas confusas emitidas sobre o caso. Motivo pelo qual há quem não tenha dúvida que o assassinato de DG foi mesmo produto de ação policial. Mas por prudência e cautela, resta esperar as investigações para fazer uma afirmação tão séria.

No entanto, o caso ganhou um novo capítulo neste último domingo, 27 de Abril, não necessariamente com novidades técnicas. O programa “Esquenta” deste dia, apresentado por Regina Casé, foi inteiro de homenagem ao dançarino, que trabalhava no programa. Não vi nenhuma referência direta à Polícia, apenas dados que comprovam os altos índices de violência no Brasil, no qual as principais vítimas são os pobres. Com o tom dramático, bem conhecido das TVs abertas, o programa alcançou picos de audiência, e sensibilizou parte significativa dos telespectadores. Um programa dominical em horário de almoço (quando a família toda está reunida) quando se dispõe a falar de um tema, detém enorme poder de influência. Com isso, acende-se ainda mais o caso da morte do dançarino que, em tempos de Copa, ganhará sem dúvida prioridade dos órgãos de investigação.

Tudo isso irritou uma parcela da sociedade. Principalmente policiais e seus parentes. As redes sociais da segunda feira acordaram cheias de imagens que buscavam aproximar a vítima ao mundo crime, e de quebra, justificar a morte. Nenhuma das imagens (uma delas com DG usando Fuzil) foi dada como autêntica, é bem provável que tenham sido montagens, mas mesmo comprovada sua veracidade, nos preocupa que o assassinato de alguém pelas mãos do Estado (caso se comprove) seja tratado como compreensível.

A Polícia militarizada não olha a favela como uma comunidade de cidadãos, mas um lugar de alto potencial delinquente. O inimigo a ser batido pode ser qualquer um deles, que quando não são traficantes, seriam seus apoiadores. Simplificação grosseira. A maior parte da favela sofre tanto com o tráfico quanto com os excessos da Polícia, e agora também com as milícias. Se a forma de vencer o crime seja abrir guerra contra uma população inteira, excluída socialmente, o preço será muito alto.

Uma sociedade de alto grau civilizatório, como testemunha nossas instituições, não pode aceitar que políticas de segurança pública sejam banhadas de sangue, que mesmo criminosos sejam julgados pelo cano de um fuzil. Temos uma Constituição, um Código Penal, tribunais que tem funções de julgamento legal, e nenhum destes permite a pena de morte.

É bom, também, não generalizarmos. Nem todo policial é corrupto, nem todo militar mata. Se os desvios acontecem, e são muitos, devemos julgar com rigor, sem condenar previamente, o que também feriria o espírito do Estado democrático de direito.

Vamos aguardar os resultados da investigação. Manter o equilíbrio para não incentivarmos maniqueísmos. Dividir a sociedade neste momento seria colocar ainda mais fogo nos conflitos que seguem acontecendo. Sabemos todos que neste caso, quem pagaria caro é a parte mais fraca, isto é, os pobres e favelados.
 

quarta-feira, 23 de abril de 2014

Sobre petistas e tucanos

Por Adelson Vidal Alves



O PT se prepara para mais uma eleição. Não, não há grandes novidades. A estratégia eleitoral do partido, montada em grandes agências publicitárias, incentivará o discurso da polarização, e trabalhará na apologia que apresenta o risco de retrocesso brasileiro aos anos “obscuros” do PSDB no poder. Tese delirante, haja vista que o Brasil não viveu anos de trevas sob os governos tucanos, pelo contrário, foi sob a direção de FHC que o país consolidou sua institucionalidade democrática e venceu a hiperinflação. Se Lula e Dilma surfaram em mares tranquilos, agradeça as reformas econômicas que os antecederam.

Os petistas também voltarão à velha denúncia de que os adversários seriam todos neoliberais, enquanto eles, desenvolvimentistas. Quem se lembra da “Carta ao Povo brasileiro”, assinado por Lula em Julho de 2002, e que antecedeu a nomeação de Henrique Meirelles, representante das elites financeiras, para o Banco Central, sabe muito bem que o PT jamais combateu com o rigor necessário a economia de livre mercado, ainda que, a exemplo dos tucanos, jamais tenha aderido por completo ao liberalismo econômico.

O fato é que o Brasil vive um ciclo de pelo menos 20 anos de uma política moderada. Talvez de centro, baseada em modestos projetos de distribuição de renda, ausência de reformas e com coalizões políticas ambíguas, sem propostas claras de país. Por um lado, foram anos de consagração da Carta Constitucional de 1988, a mais democrática de nossa história, de estabilização da economia e com ampliação de políticas sociais. Por outro, a presença insistente da orientação liberal no campo econômico, na falta de iniciativa reformista, que poderia modernizar de vez o Estado brasileiro e dar passos significativos em direção de soluções permanentes da vida democrática.

PT e PSDB guardam semelhanças. Quem sabe poderíamos chamá-los de “social-liberais”? Com o risco da imprecisão do termo. O segundo, porém, parece ser mais comprometido com a democracia política. Tirando a infeliz articulação da aprovação do projeto de reeleição no Congresso, os tucanos se comportaram com maturidade diante das relações nem sempre harmoniosas entre os poderes republicanos. O PT, fiel a seu DNA autoritário, que lhe impediu de votar com a Constituição que se aprovava em meio a redemocratização, sempre demonstrou ser capaz de romper com exigências da democracia para fortalecer a si mesmo. Não é nada saudável que o partido e seus altos dirigentes sigam desafiando o STF e seus membros, fantasiando um caráter político que o órgão jamais mostrou ter.

O pleito que se aproxima ameaça desenhar a velha polarização dos dois partidos que há anos disputam os principais postos do Estado brasileiro. Esperávamos avançar para um pluralismo mais sólido em nossa tradição política, não conseguimos. A sociedade civil brasileira parece ter encolhido em suas próprias deficiências históricas, que mesmo se apresentando no formato “ocidental”, ainda não nos ofereceu a dinâmica que poderia mostrar ao país alternativas que falassem pela diversidade de interesses da nação, que se fazem sentir nos conflitos cotidianos, motivados por questões de classe, gênero ou cultura.

Se as opções seguem, mesmo depois das manifestações de Junho, sendo variações de uma “pequena política” historicamente esgotada, sinal de que não nos basta sair às ruas para agredir a política, falta nos integrarmos de corpo e alma a nossa vida institucional, composta das falhas denunciadas nas Jornadas de 2013, mas com o potencial de se fazer avançar a vida cívica que todos os adeptos da democracia anseiam para o Brasil.

segunda-feira, 14 de abril de 2014

Desilusão com a política: 3 consequências possíveis para 2014

Por Adelson Vidal Alves



Junho de 2013 levou às ruas do Brasil milhões de brasileiros, descontentes com os serviços do Estado e com a política em geral. Não à toa os partidos políticos foram hostilizados nas manifestações que aconteciam. Havia no ar uma desilusão com a política e suas instituições, vistas como arcaicas, corruptas e ineficientes.

O desapreço pela política institucional logo se mostrou em pesquisas eleitorais, realizadas pouco tempo depois das manifestações. Viu-se nelas o aumento das intenções de votos nulos e brancos, assim como o desmoronamento da maioria dos governantes, muitos deles até hoje não se recuperaram. Razão pelo qual é de bom grado atentarmos para a influência que o espírito de Junho pode ainda exercer no pleito de outubro. A desilusão com a política, expressa em muitos cartazes dos protestos, apresenta pelo menos três possíveis consequências eleitorais:

A primeira mostra uma chance para as oposições. Em tempos de desilusão, ser situação é ficar no olho do furacão, é ser alvo preferencial da fúria. Momentos como esse oferecem possibilidades para o aparecimento do novo, para a renovação. Mas no caso atual, pelo menos no que diz respeito a corrida presidencial, a oposição não vem conseguindo se apresentar como novidade. Se a candidata do governo está em queda, não há entre seus adversários nenhum crescimento significativo. Conseguirão eles, num curto prazo de tempo, apresentar ao país um projeto convincente capaz de canalizar a insatisfação do eleitorado?

A segunda possibilidade tem a ver com a abstenção eleitoral. Temos números que mostram o aumento de pessoas que se recusam a escolher um candidato, tratando todos como iguais. É possível, assim, que votos nulos e brancos ganhem grande quantidade, o que para democracia seria ruim, haja vista que o poder constituído deixaria de ter o carimbo de milhões de cidadãos.

A terceira talvez seja a mais grave. Com a desilusão coletiva, há quem resolva fazer da política, instrumento de ação para o bem coletivo, uma ferramenta para ganhos pessoais. É ai que entra o poder econômico, oferecendo dentaduras, cestas básicas e sacos de cimento. Como o eleitor desiludido trata todos como iguais, vender seu voto seria a melhor forma de não se perder tanto numa eleição que se repete todos os anos sem nada mudar.

O fato é que as eleições de 2014, coladas com a Copa do Mundo, podem apresentar resultados surpreendentes, seja pela mudança qualitativa ou pela desistência quantitativa. De certo, temos a certeza de que quando a política fracassa, fecha-se o canal principal para resoluções cívicas dos problemas de nossa sociedade contemporânea. Caso a política perca o papel mediador no processo de mudanças que exige a sociedade, corremos o risco de abrir frentes violentas e autoritárias de luta. Nesse caso, estaríamos promovendo um terrível retrocesso.

quinta-feira, 3 de abril de 2014

A falta que nos faz uma esquerda democrática

Por Adelson Vidal Alves

O ano de 1988 pariu a mais democrática Constituição de nossa história, a “Constituição Cidadã”, nas palavras de seu mais dedicado pai. Seu formato republicano dá sustentação para ampliarmos a democracia política, econômica e social do Brasil. É bem verdade que ainda estamos longe de podermos estufar o peito de orgulho de uma nação justa, mas é inegável os avanços significativos do país nos últimos 20 anos.

Com FHC, estabilizou-se a economia, deu-se a largada para programas sociais de distribuição de renda e reestruturação do sistema educacional. Com Lula as políticas sociais se ampliaram, os movimentos sociais tiveram mais espaço na política, e o Brasil que temos hoje tem todas as condições de dar passos mais ousados na tão sonhada vitória sobre as desigualdades que assolam historicamente nossa pátria.

Mas para isso, faz-se urgente a retomada de reformas estruturais democráticas, que nem o PSDB e nem o PT fizeram em seus mais de 20 anos de hegemonia no poder central. Ambos se renderam à “pequena política” que não põe em cheque a discussão do modelo de Estado que queremos. Tucanos e petistas também deram sinais de retrocessos autoritários. FHC aprovou sua própria reeleição, numa votação parlamentar ainda hoje envolvida em desconfianças. Colocou o exército para enfrentar uma greve de petroleiros. Lula e o PT seguem desafiando altas instâncias do Poder Republicano, sobretudo ao STF, que foi recebido com desobediência na Câmara dos deputados, quando esta era dirigida pelo petista Marcos Maia. O PT ainda insiste numa tese delirante de que o julgamento da Ação Penal 470 foi um julgamento político, o que colabora com atos insanos de protestos contra s Suprema Corte.

Precisamos de uma esquerda democrática forte, com vocação de governo e capacidade de articulação para conquistar consensos civilizatórios. Nos falta esta esquerda, em gestação em pequenos partidos e movimentos da sociedade civil, mas ainda sem um rosto para se apresentar ao Brasil. Tal esquerda deveria se diferenciar daquela que hoje dirige o país, e também do formato extremo que assumiu em legendas nanicas da oposição. A esquerda democrática que faz tanta falta, precisa tomar a Constituição como seu programa, o Estado de direito como palco exclusivo para transformações substanciais na sociedade. Não se pode deixar seduzir por cantos autoritários, que apresentam atalhos para realizações de seus projetos, buscado contornar a normalidade democrática.

A esquerda democrática que necessitamos deve se despir de todo messianismo, e se aceitar como uma peça na engrenagem complexa de nosso sistema político, buscando o diálogo constante com todas as forças interessadas em fazer ir adiante o aprofundamento democrático, mesmo as mais moderadas e conservadoras.

Não é tarefa fácil, haja vista que nossa modernização conservadora, realizada por cima e de forma “prussiana”, influenciou uma cultura “estatolátrica”, autoritária e até golpista. Porém, em tempos onde celebrações golpistas são rechaçadas pela sociedade, é possível que estejamos engrossando uma vivência democrática, que seria o primeiro passo para fundar as bases de uma governança direcionada a liberdade plena, entendida dentro dos limites do Estado de direito.

Pode demorar, mas é provável que o tempo nos traga esta esquerda, por enquanto, ela é apenas uma referência.