quarta-feira, 23 de setembro de 2015

Política e cultura em Volta Redonda

Por Adelson Vidal Alves



A cultura recebeu, no decorrer da história, uma série de conceitos e significados. Em outros tempos, ela estava ligada à beleza das artes. A relação e o gosto pelo belo era coisa de gente culta, de refinado talento para apreciar o que de melhor havia nas artes. Mais tarde, recebeu a função educadora, cabendo a ela o papel civilizatório de retirar as massas ignorantes e estúpidas de seu estado rude. E por fim, já nos nossos tempos, ela tem sua definição ampliada para o campo da produção simbólica que envolve os homens de todas as classes.

Como objeto de política de Estado, a cultura aparece somente na segunda metade do século XX, especialmente na França, no governo de Charles de Gaulle, que criou talvez o primeiro Ministério da Cultura em todo o mundo. Este, nas palavras do ministro André Malraux, era “encarregado de assuntos culturais”, “com a missão de garantir a maior audiência possível para o patrimônio cultural francês”, além de “promover obras de arte que enriquecem seu legado”.

Desde então, quase todos os países democráticos adotaram políticas públicas de cultura, voltadas para a promoção da diversidade cultural, assim como o fomento e a garantia da liberdade de criação artística. No Brasil, a cultura ganhou atenção ministerial entre meados da década de 1980 e início da década de 1990.

Os municípios, em geral, também criaram secretarias, fundações ou órgãos públicos responsáveis pelas políticas públicas de cultura. Em Volta Redonda não foi diferente. No entanto, a cidade jamais pode usufruir do que poderíamos chamar de uma política cultural genuína. Estranho, porque na cidade do aço a cultura ferve, não só pelo talento dos artistas locais, mas pela diversidade artística que oferece. Em 2012, às vésperas das eleições para a prefeitura, um forte movimento de artistas, poetas, músicos, e intelectuais resolveu reivindicar mais investimento público em cultura. Misteriosamente, finalizado as eleições e com a reeleição do prefeito, este movimento se dissolveu em reuniões secretas com a nova secretária de cultura, a desconhecida Rosane Gonçalves.

Rosane é ligada ao deputado fundamentalista Edson Albertassi, e pior que seu antecessor, Moacir de Carvalho, promoveu um profundo processo de cooptação da classe artística, que se calou mediante suas demandas corporativas atendidas. O movimento cultural, então forte e respeitável, se sucumbia a interesses pessoais mesquinhos, ao mesmo tempo em que fortalecia uma secretária de Cultura estranha no seu próprio cargo.

Hoje, quase 3 anos depois da reeleição de Antonio Francisco Neto, Rosane, desprovida de qualquer plataforma de cultura, segue tranquila no comando da Secretaria, sem ser incomodada pelos gritos até então histéricos que se direcionavam contra seu antecessor. Seja lá o que aconteceu, todo o fogo dos artistas de Volta Redonda foi completamente apagado no gabinete da Secretaria de cultura. Vai saber a que preço um movimento aparentemente tão disposto foi sufocado.

           
            

quarta-feira, 16 de setembro de 2015

Libertai os cativos

Por Adelson Vidal Alves



No ano 1757, diante da porta de uma igreja de Paris, um homem era puxado e desmembrado por quatro cavalos que o rasgaram ao meio ao puxarem seus braços e pernas para lados opostos. Antes de ser desmembrada, a vítima teve suas pernas arrancadas e seus nervos retalhados. Depois de tudo finalizado, as partes de seu corpo foram queimadas e jogadas ao vento.

A cena de terror acima narrada fez parte de um cerimonial de punição. A vítima teria sido um homem acusado de assassinato. Tais rituais públicos faziam parte do sistema de penalidades que vigorou em grande parte das monarquias no Antigo Regime. Aqui, o que valia como pena disciplinar era o suplício dos condenados, sempre em forma de espetáculo, sob o olhar de milhares de pessoas.

Nosso direito penal moderno evoluiu, a ponto das penas já não serem mais guiadas pelo paradigma do suplício, e mesmo nos países onde ainda vigora a pena de morte, as execuções se dão de forma rápida e eficiente, aos olhos de um público pequeno e selecionado.
A punição dos Estados modernos democráticos avançou ao ponto de colocarmos como principal valor penal, não mais o sofrimento e a vingança, mas a regeneração dos criminosos. Hoje, a principal instituição de aplicação de penas nas democracias mais avançadas é a prisão.

A prisão, em sua forma atual, tem basicamente dois objetivos: remover o criminoso de convívio social e sua reeducação para a vida em sociedade. Tais objetivos, no entanto, só terão razão de existir caso o condenado e toda sociedade saiam ganhando. E aqui cabe perguntar: o sistema prisional tem cumprido sua função? A sociedade vem colhendo frutos positivos do encarceramento de milhares de pessoas? A resposta é não.

No Brasil, cerca de 70% dos presidiários são reincidentes. Isto é, 7 a cada 10 presos depois de saírem da cadeia voltam a cometer crimes. A explicação é lógica. Ao serem detidos, esses criminosos são carimbados com uma marca eterna de assassinos, ladrões, estupradores etc, mesmo quando tem suas penas cumpridas. Fora da prisão não conseguem trabalho decente, são discriminados pela sociedade, e sentem dificuldades até mesmo em suas relações afetivas. O conjunto disso tudo potencializa  a chance de um novo crime. Além do mais, um criminoso ocasional, ao entrar para prisão, pode sair de lá um delinquente. Um jovem pobre que roubou para comprar remédios para mãe, em contato com a escola do crime prisional, pode sair de lá membro de uma facção criminosa, com todos os sotaques de alguém realmente perigoso para a sociedade.

Outro aspecto a ser levado em conta é o fator econômico. Quando um pai de família comete um crime e é preso, sua família perde uma importante fonte de renda. Sem amparo do Estado, está ali montada todas as condições para ser gerado novos criminosos. Neste aspecto, o encarceramento duradouro de pessoas não vem trazendo benefícios para o coletivo, pelo contrário, com tudo que nosso sistema penitenciário oferece, o mais comum é que os presos devolvidos a sociedade difundam o crime, antes um ato isolado, e agora sistematizado numa prática de vida.

Sendo assim, o que devemos fazer? Em primeiro lugar, antes de visualizarmos novas instituições penais, devemos nos concentrar em valores importantes que devem nos nortear na construção de um novo sistema de punição.


Penso que é preciso dividir responsabilidades. Antes de alguém cometer um crime, uma série de fatores articulados favoreceram a execução do ato infracional. A sociedade desigual, os problemas sociais, a correria excessiva de uma sociedade pós-industrial, a omissão dos governos na promoção de justiça, tudo isso precede o tiro do assassino, o grito do ladrão e o golpe do agressor. Não seria mais justo assumirmos uma parte dessa culpa? Mesmo que não inocentando o infrator, não seria mais eficiente e justo pensarmos em soluções conjuntas que atendam a reparação das vítimas e a recuperação humanitária do criminoso? Não ganharia a sociedade estabelecendo relações de pena e correção, de modo a evitar crimes futuros? Tá na hora de pensarmos nisso. 

sábado, 5 de setembro de 2015

O cabo de guerra da crise

Por Adelson Vidal Alves



Me parece óbvio que a permanência de Dilma na presidência só retarda ações mais ligeiras no trato da crise econômica que assola o país. Sua saída promoveria um ambiente mais propicio para que saiamos deste delicado momento. Entretanto, os caminhos democráticos para sua destituição encontram-se embaraçados no jogo de forças político.

O governo segue sem rumo, e para amenizar sua impopularidade, recorre a retóricas que tentam responsabilizar inimigos por um suposto exagero no dimensionamento da crise. Nas oposições, a incapacidade de se compreender que o momento não é o de acirrar ânimos ou mesmo destruir o PT, mas de trazer de volta ao país a normalidade da resolução pacífica dos conflitos, afastando qualquer perigo de polarizações autoritárias que ofereçam riscos às instituições.

O impeachment já reúne as condições básicas para sua realização, mas é o caminho mais perigoso, podendo causar traumas, sem falar que sua realização exige um longo e penoso processo, quando o que precisamos é uma saída rápida. O ideal seria a renúncia da presidente, e a posse imediata de seu vice Michel temer. Isso possibilitaria a criação de um pacto nacional, que aceleraria as reformas e medidas anti-crise.

Isso não significa anistiar o governo, e muito menos eliminar os necessários  embates entre  oposição e governo. Com temer, deve-se priorizar uma agenda minimamente consensual e equilibrada, restando ao PT o papel de assumir a postura de responsabilização da crise que produziu, apoiando o novo governo ou saindo e se isolando no pacto político. Às oposições e à base governista, sobretudo o PMDB e PSDB, resta a tarefa de liderarem a construção do programa político deste governo de unidade nacional.

Talvez, com isso, o próprio governo recupere fôlego, e Temer e o PMDB ganhem forças que poderiam impedir a necessária mudança que todos esperamos em 2018. Só que no atual momento a crise se apresenta como um cabo de guerra, onde ninguém consegue vencer, e o país se torna a corda, esticada pelos dois lados e cada vez mais fragilizado. Encontrar um caminho conciliatório é impedir que a corda arrebente para o lado mais fraco.